domingo, 13 de julho de 2014

T R A J E S   D O M É S T I C O S
Pediram-nos que escrevêssemos como foram os trajes domésticos de nossas infâncias. Também nos foi pedido á falar daqueles trajes em crianças que nos obrigavam há usá-los, porém, eu os detestava.
É impossível falar de costumes de um povo sem levar em consideração sua condição financeira. Apesar dos dizeres: não é a barba que faz o filósofo, não é o hábito que faz o monge; e tantos outros. Na prática a coisa não é bem assim, pelo contrário, as aparências enganam, “a primeira impressão é a que fica”, sou mais essa citação.
Com raríssimas exceções, pela a maneira de vestir de alguém, entende-se sua situação financeira e a que classe social ela pertence. Eu nunca neguei para ninguém como foi pobre minha infância, também, nunca fiz segredo da pobreza daquela gente que faziam parte de meu mundo.
No meu livro: “O Anjo da Noite e Outros Contos” tem uma crônica, - Tocador de Pífano – em que entre outras coisas eu descrevo a roupa do João Moreira, ela era só remendo e o resto todo rasgão. Aquele traje dele não era exceção naquelas paragens, os remendos e os rasgões na roupa do trabalhador rural eram comuns, e foi naquele mundo que eu vivi.
Eu aos dezesseis anos de idade e, pertencendo a uma parcela da sociedade local. E que minha condição financeira não acompanhava. A prova disso ficou provada num fato que não dá para esquecer. Ia haver uma grande festa e para a qual eu deveria comprar um terno novo, afinal todos os meus colegas comprariam; também minha namorada era filha de um rico do lugar, não dava para disfarçar. Não pude custear. Não deu! E sem poder comprar a tal indumentária, somente uma opção me restava: migrar. Ir embora. E foi isso que me fez deixar minha terra natal ainda quase criança.  – Sem mágoa! – Meu querido Ceará não perdeu um filho, continuo amando como filho que sou.  Porém, o Rio de Janeiro ganhou um carioca. Por todos esses fatos narrados aqui, aquelas crianças de lá nas quais eu estava incluído, não possuíam mais de duas roupas. Dessas, a melhor era escolhida para ir á missa, sair aos domingos e para ir ás diversões. A outra era chamada de -bate e veste- isso porque, essa pobre coitada agüentava o maior tranco de segunda a sexta-feira na roça, e sábado ia para a pedra, ser batida para largar o grude. Esses eram nossos trajes domésticos.
Quanto ás roupa que nos era oferecido em criança e que vestíamos, porém não gostávamos. Fica muito difícil. Depois que descrevi as dificuldades que aquela gente tinha para comprar uma roupa, seria no mínimo um contra-senso dizer que alguma roupa nos era oferecida e que nós não gostava. Podia ser até mesmo feita com o riscado ceará, um tecido de algodão cru feito em Sobral e que tinha umas listas na vertical, verde ou azul.
Do livro: “Fragmentos  de Uma Oficina Acadêmica”
De Amadeu Lucinda.

Clique para responder para todos

Nenhum comentário:

Postar um comentário