segunda-feira, 30 de março de 2015


Todo dia é dia de Natal
Já passei por alguns aeroportos deste mundo e, por isso, digo e repito que não há nada mais animado que uma rodoviária do Ceará na véspera do Natal. Tudo na vida tem seu lado bom e não adianta cara feia pelo calor e lotação. É melhor tentar chegar cedo e aproveitar o movimento do Terminal Rodoviário Engenheiro João Tomé, mais conhecido como “rodoviária grande”. É povo puxando mala, formando as filas em formato de caracol pra comprar passagem, correndo e puxando os meninos pelo braço rampa abaixo para chegar à plataforma na hora.
Antes a empresa era Horizonte, hoje é Princesa dos Inhamuns, mas a alegria é a mesma ao ver o transporte chegando no horário marcado no bilhete. Começa uma das partes mais animadas: guardar os pacotes no bagageiro. Televisão, boneca gigante, ventilador, peru congelado enrolado no jornal (técnica milenar de conservação certamente aprendida nas respectivas cidades de origem de cada passageiro) e muitas malas recheadas de presentes cuidadosamente embalados e que, por sinal, são um prato cheio para a nossa imaginação. O que teria ali? Quem rasgaria tal papel de presente colorido e estampado?
A viagem começa, os últimos passageiros embarcam na Rodoviária do Antônio Bezerra e já na saída de Fortaleza é possível ver alguns fazendo o “Sinal da Cruz” e ouvir as histórias de pais, mães, filhos que deixaram irmãos, tios, avós no interior e estão rumo ao reencontro. Alguns já colocam seus fones no ouvido, muitos ligam para os parentes, pedem “a bença” e avisam que já estão saindo da capital, outras já falam sobre o jantar na casa de um ou almoço do dia seguinte na casa de outro.
Em Caucaia, as pessoas já se acomodaram. Muitos já começam a tirar alguns lanches das bolsas e sacolas de plástico para matar a fome que já começa a bater ou, simplesmente, buscam algo para mastigar e passar o tempo. Começa o entra e sai do banheiro. Torcer pela integridade higiênica de um banheiro em uma viagem relativamente longa é sempre importante.
O velho cochilo começa a falar mais alto. Caridade é a hora de abrir o olho e esticar a cabeça para tentar ver o Santo Antônio na beira da estrada. Muitas vezes acordo exatamente na hora de ver a imagem e isso pra mim é sinal de que será uma viagem abençoada. É hora também de rezar pelos que ficaram e pedir uma volta em paz após as festas.
É só alegria avistar a estátua de São Francisco em Canindé e comprar uma broa ou rosquinha na rodoviária.  É hora também de esticar as pernas na parada obrigatória para enfrentar mais algumas horas de viagem. Não falta comida boa para quem gosta, principalmente, para os motoristas e cobradores que fazem uma merecida refeição com tanto gosto.
Em Santa Quitéria, o sono muitas vezes já está grande novamente, a alegria começa a bater só em pensar que, pelo menos pra quem vai descer na “Terra da Virgem dos Lábios de Mel”, já passamos da metade da viagem. As águas de Hidrolândia eu nunca vi, mas a pracinha da cidade é uma das mais fofas da região e sempre vale a pena olhar o movimento pela janela.
A realidade é que o estirão após Hidrolândia parece ser maior do que realmente é, com toda certeza,  virar à direita no “T” é uma alegria sem fim. Ver as primeiras luzes e enfeites natalinos nas casas e na Praça da Iracema significa sair do frio do ar condicionado e desembarcar no calor dos abraços e sorrisos que esperam na pequena rodoviária de Ipu. Descemos sempre dando graças a Deus e o ônibus segue levando saudades serra acima.
Lívia Xerez



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