domingo, 3 de abril de 2016

ABÍLIO MARTINS 

Extraído de:

TIGRE, Bastos; SOLDON, Renato.  Musa gaiata (Antologia da Poesia Cômica Brasileira). Edição completa.  Rio de Janeiro: Editorial Unidade Limitada, 1949.            130 p   [CONSERVANDO A ORTOGRAFIA ORIGINAL]

  Abílio MARTINS foi, sem dúvida, uma das mais formosas inteligências do Ceará. Espírito vivaz e faceto, boêmio por índole, viveu sempre alegre e sem inimigos. 

Justiniano de Serpa, em 1925, quando governava aquele Estado, numa época de grande agitação política, convidou Abíllo para a Secretaria de Polícia. Ocupando o cargo, no qual, por circunstâncias várias, os seus antecessores se vinham incompatibilizando com a opinião pública, dera-se com ABÍLIO justamente o contrário: cresceu-lhe o número de afeições e o Ceará se transformou num verdadeiro seio de Abraão.

     Poeta de grande sensibilidade dedicava-se, principalmente, à poesia epigramática, em cuja faina não poupava mesmo os seus mais afeiçoados companheiros.

O juiz de direito João Damasceno Fontenele, em 1913, teve séria desinteligência com o então presidente Franco Rabelo, porque este o transferira da sua para outra comarca.

ABÍLIO que de tudo sabia, tripudiou:

_Foi em Viçosa que nasceu o João... 
E, quando o João nasceu lá em Viçosa, 
já foi com vocação.

pra vida preguiçosa

de Juiz substituto no sertão.

 


   Cara, pescoço e pernas, tudo fino... 
    E FINO, em tudo mais,

fui até bom morrer, assim menino, 
diabo desse rapaz...

Franco o removeu, 
e o João virou,

e o João teimou 
e o João mexeu, 
até que, enfim,

veiu os ossos deixar em Camocim...

o clero cearense, em 1923, desenvolveu - mas em pura perda - forte campanha contra as festas dançantes, condenando principalmente o tango, sob o fundamento de ser de importação dos cabarés argentinos e, como tal, abominável aos espíritos de formação cristã.

ABÍLIO que em tudo metia o bedelho, saiu-se pela prensa, com este descante:

_Chega ao céu uma defunta, 
loura, franzina, catita...

São Pedro, grave, profundo, 
vendo a defunta bonita,

coça a barba, se concentra, 
se concentra e lhe pergunta:

_Dançaste tango no mundo?

_Dancei São Pedro... 
_ Pois entra...

 

A população da capital cearense, em 1920, foi surpreendida pela aparição sensacional de um galo com chifres.

 

Os jornais se ocuparam do fenômeno e o poeta lá esteve para, de visu, observá-lo. Instantes depois registravam as suas impressões:

_ Eis um fato banal,

que nem merece a pena comentá-lo, 
pois me parece muito natural

o que acontece ao galo...

Penso que o galo, como o cidadão, 
tendo o seu lar... no fundo do quintal, 
e, entre a família, nome e projeção, 
está sujeito

ao mesmo preconceito, 
de ordem social,

que rege e orienta a vida conjugal.

 

Vê-se, portanto, positivamente, 
que a Natureza tinha,

de cédo ou tarde, assinalar o mal...
Pois se a mulher do galo, infelizmente, 
foi sempre uma galinha,

a cabeça do boi era fatal...

Muito cuidado, camaradas, tomem:

se a Natureza fez assim com o galo, 
pôde fazê-lo muito bem com o homem...

   Cumprimentando, por seu aniversário, ao virtuoso Monsenhor João Alfredo FURTADO, Cura da igreja da Sé, em Fortaleza ABÍLIO mandou-lhe estes versos:

 

__ Parabéns pelos anos que ontem fez 
e pelos outros que há de festejar!
Mando-lhe este soneto que, talvez, 
nem mesmo valha a pena conservar.

Logo que o leia, rasgue-o duma vez, 
não caia na tolice de mostrá-lo.

ao Climério _ doutor em Português _
que muitos erros nele há de encontrar.

Mas isso nada vale... O que tortura 
o meu já pobre cérebro cansado,

é ninguém dar-me explicação segura

sobre este paradoxo danado:

Você nunca foi médico, mas CURA...

E sempre honesto foi, mas tem FURTADO...

Extraído de:

TIGRE, Bastos; SOLDON, Renato.  Musa gaiata (Antologia da Poesia Cômica 
          Brasileira). Edição completa.  Rio de Janeiro: Editorial Unidade Limitada, 1949.  
          130 p

 


 

Nenhum comentário:

Postar um comentário