A
Chegada do Trem
Por:
Francisco Melo (Prof.).
Os mais velhos se recordam dos horários do trem, que chegavam e partiam
pela manhã ou à tarde, sempre reunindo platéia de Ipuenses. Era um “footing”
que rivalizava com as retretas na “avenidinha”, (de Iracema) – no Coreto, que
hoje não existe mais. Não faltando sequer às meninas enamoradas bem
arrumadinhas e cheirosas, com os galãs da moda fazendo à corte a pompa
possível.
As segundas, quartas, sextas e sábados, às 08h40min horas passava o
horário de Crateús rumo a Sobral e Fortaleza; as terças quintas (de Camocim),
sextas e domingos, era à volta, às 14 horas.
Quando o trem partia de Pires-Ferreira ou Abílio Martins, as estações
mais próximas para o norte e sul, respectivamente, o telégrafo avisava e a
sineta da estação tocava para todo Ipu ouvir e saber que houvera a “partida”;
era preciso apressar-se e caminhar, que dentro de uns vinte minutos, ou coisa
assim, chegaria à composição despejando e colhendo passageiros. O trem tomava
água numa grande caixa d’água existente a uns cem metros da famosa Ponte Seca,
(ah! Ponte Seca) dali dirigindo-se para a Estação soltando da descarga de vapor
uma imensa nuvem branca e gelada de fumaça – não se sabe direito porque gelado,
e como diversão mergulhava na vaporização a meninada sempre com grande prazer e
alegria.
Quando o “trem horário” partia e já lá nas imediações das Pedrinhas ou
no corte, isto é quando já tomava velocidade soltava um longo apito que todos
ouviam no Ipu (apito saudoso). O mesmo acontecia quando chegava exatamente nas
proximidades das Pedrinhas e Corte. Os retardatários que se apresassem. Para
avisar da partida, o sino da Estação tocava três sinais, com ligeiros
intervalos entre um e outro. O chefe-de-trem soprava seu apito autorizando a
partida. Era a hora das despedidas, muitas das quais ficaram na eterna
lembrança de namorados, noivos, mães, maridos e filhos que partiam talvez para
sempre.
A locomotiva soltava então um rápido apito a vapor, dava um puxão nos
vagões, e partia fumaçando, e lá se vai o trem levando saudades e deixando
tristezas. Uns partiam para sempre, outros teriam um breve regresso.
Não deixando de acontecer nas vindas de Fortaleza, os Jornais da Época:
O Correio do Ceará, Unitário o “Povo” e revista “O Cruzeiro”. A revista O
Cruzeiro era esperada com certa ansiedade pelos intelectuais da cidade para serem
lidos e comentados os artigos de David Nasser e Raquel de Queiroz, e também a
interpretação da “charge” do Amigo da Onça, de Péricles (O Pequim) era um
sucesso. Comerciantes aproveitavam para receber e enviar encomendas a outras
cidades, alguns deles até fechavam a Casa Comercial para cumprir parte de suas
obrigações comerciais com o trem – horário, no tocante as correspondências,
especialmente para Sobral.
Na demora do trem na estação os freqüentadores da passagem do horário e
os próprios passageiros aproveitavam para comprar bolachas, pão, cocadinhas, e
“bulins”; tomar o café donzelo da Arlinda, o refresco o “Diassucar”. Na volta
os admiradores e apaixonados pelo trem paravam obrigatoriamente na padaria da
esquina da praça para degustar o pão carioca quentinho saindo naquele momento,
era a Padaria do Antonio Rocha. Mais adiante aproveitávamos para saborear uma
bolacha de fabricação especifica do seu Manoel Assis a “Hoste Luiz”.
Quantas saudades ficaram sepultadas para todo o sempre no último olhar
em direção ao comboio que partia aos apitos já bem distantes, bem depois do
corte.
Quantas separações! Quantos romances desfeitos!Quantas vidas
desencontradas que ficaram para trás, de quem partiu, e na direção do “horário”
de quem ficou.
Velho Ipu! Velho trem! Nunca
mais!
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