segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

domingo, 23 de fevereiro de 2014

Ipu Antigo VII


Vista da cidade (1940). Acervo: prof. Mello.
É preciso esclarecer, igualmente, que mesmo antes da chegada dos trilhos, o município apresentava uma importante produção de algodão, açúcar e outros gêneros, contando, apenas no perímetro da cidade, com 13 engenhos de produção de açúcar, aguardente e derivados da cana, 10 de ferro e 3 de madeira,  como anota ainda Antônio Bezerra de Meneses em 1884:
Admirei a quantidade de algodão em caroço que entrava continuamente dos pontos vizinhos, e que oferecia serviço incessantemente ao locomóvel do Sr. José Liberato de Carvalho[1], e às inúmeras máquinas no descaroçamento e arrumação em sacas desse valioso produto, a fim de serem transportados aos centros consumidores.
Não é somente algodão que se cultiva com vantagem no município, mas o açúcar, a aguardente, a rapadura, os cereais, e porção de gado no sertão[2].
Toda uma gama de artigos, produzidos em âmbito local e comercializados no circuito interno, passou a ter um meio de escoamento: rapadura, farinha, arroz, feijão, mamona, couro, cereais, lenhas, gado e outros. Produtos como o algodão e o açúcar, cada vez mais importantes e que já eram exportados para outras localidades, mesmo antes do advento do trem, ainda que precariamente, passam a ter, neste transporte, um grande suporte para o incremento da produção e atração de capitais.
Da mesma forma, o trem teria favorecido o crescimento das transações comerciais e o surgimento de inúmeros pequenos e médios estabelecimentos erguidos nas primeiras décadas do século XX, e que passaram a comercializar com os produtos da economia local ou importados de outras praças, alguns deles de grosso trato[3]. Data deste momento, ainda, o surgimento das feiras diárias, verificado no período, e uma maior circulação de capitais. Toda a produção de hortifrutigranjeiros da fértil serra da Ibiapaba descia a ladeira da mina, na subida da serra, e encontrava nas feiras, ao redor do Mercado Público, um meio de escoamento. Elas exerciam ainda uma atração de pessoas e mercadorias produzidas em cidades vizinhas.
Muitos são os relatos das feiras que ocorriam em torno do mercado nos anos iniciais do século XX, sobretudo aquelas realizadas aos sábados, as mais concorridas, e que exerciam atração sobre uma grande quantidade de pessoas das regiões rurais do município e de outras cidades, como aquele escrito por Francisco Magalhães Martins, que viveu aqueles anos. Inicialmente, o autor discorre sobre o crescimento da cidade com a chegada da ferrovia, para depois falar da importância das feiras:
(...) Na cidade corria dinheiro, o comércio tornou-se ativo, abastecendo não só os habitantes dos sertões cearenses do alto Acaraú como o da Serra-Grande e de alguns municípios do Piauí.
Passavam, então, pelas estradas que cruzavam o antigo Ipu-Grande, as tropas e boiadas tangidas por comboeiros e por vaqueiros metidos em gibão e chapéu de couro. Muitos vinham dos sertões de Santa Quitéria, Ipueiras, Tamboril, Inhamuns; alguns demandavam o Piauí, subindo a Ibiapaba pela ladeira da Mina e do Corrente, esta mandada fazer por D. Pedro II. As feiras ficavam regurgitando de sertanejos e serranos, mascates, vendeiros, cegos pedindo esmolas, cantadores tocando violas. Os matutos tiravam do dorso de alimárias as cargas de gêneros, farinha, rapadura, frutas: amarrando os animais de sela ou de cangalha – cavalos, muares, jumentos – nas árvores em derredor do mercado, insuficientes para tantos[4].
Em outros relatos, Francisco Magalhães Martins e Francisco das Chagas Paz arrolam uma infinidade de produtos que eram comercializados nas feiras: cereais, peles, artigos produzidos nos engenhos, frutas, legumes, galináceos, animais de pequeno e grande portes, carne, peixes, mel de abelha, tapioca, raízes, folhas, sementes de plantas medicinais, farinha, goma, arroz, artigos artesanais, dentre outros[5].



[1] José Liberato de Carvalho era sócio do cel. José Lourenço de Araújo e de Antônio Manuel, na firma Lourenço Martins & Cia. A firma comprava gado do Ceará e vendia madeira do Pará. Ver, MARTINS, Francisco Magalhães. Ídolos, Heróis e Amigos. Ensaios Críticos. Fortaleza: Gráfica Editorial Cearense, 1982, p. 58.
[2] MENEZES, Antonio Bezerra de. Notas de Viagem. Op. cit., p. 202.
[3] Sobre este crescimento econômico e as transformações geradas, ver FARIAS FILHO, Antonio Vitorino. O Discurso do progresso e o desejo por uma outra cidade: imposição e conflito em Ipu-CE (1894-1930). 2009. 151 f. Dissertação (Mestrado Acadêmico em História e Culturas) - Centro de Humanidades, Universidade Estadual do Ceará. Fortaleza.
[4] MARTINS, Francisco Magalhães. Ídolos, Heróis e Amigos. Op. cit., p. 54-55.
[5] Ver: MARTINS, Francisco Magalhães. O Coronel João Martins da Jaçanã. Fortaleza: Henriqueta Galeno, 1997, p. 13.  PAZ, Francisco das Chagas (Direção). Almanaque Ipuense. Nº 2, Ipu: Oficinas Gráficas da Escola Profissional de Ipu, 1963, p. 79.

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