Hábeas Pinho
Do Poeta
Ronaldo Cunha Lima
Certa
noite, de lua cheia os seresteiros da cidade de Campina Grande, estavam
saudando a lua, fazendo uma romântica serenata... lá pras duas da madrugada,
surge uma roda policial a época chefiada pelo então Cap. Luiz de Barros, que,
alegando perturbação do sossego público, proíbe a serenata... não adiantaram os
apelos, alegações, etc... O violão foi para a delegacia...
No dia
seguinte, foram os boêmios procurar o Dr. Ronaldo Cunha Lima. Advogado
militante, pedindo sua interferência para liberar o violão. O Dr. Ronaldo
procurou o Juiz, Arhur Moura, então titular da 2ª Comarca de Campina Grande,
pedindo que autorizasse a soltura do pinho... o Dr. Juiz sabendo que o
brilhante advogado era Poeta, pediu que fizesse a petição em versos.... O Dr.
Ronaldo Cunha Lima não se fez de arrogado... foi a maquina, e requereu o HÁBEAS- CORPUS DO VIOLÃO...
O instrumento do crime que se arrola
Neste processo de contravenção,
Não é faca, revolver, nem pistola,
É, simplesmente, doutor, um violão...
Um violão, Doutor, que em verdade.
Não matou, nem feriu um cidadão,
Feriu sim, a sensibilidade.
De quem o ouviu vibrar na solidão!
O vilão é sempre uma ternura,
Um instrumento de amor e de saudade,
O crime a ele nunca se mistura,
De quem ouviu vibrar na solidão!
O violão é próprio dos cantores,
Dos menestréis de alma enternecida
Que cantam as mágoas, que povoam a vida,
E sufocam as suas próprias dores!
O violão é música é canção,
É sentimento, é vida, é alegria,
É pureza é néctar que extasia,
É a dor espiritual do coração!
Seu viver, como o nosso, é transitório,
Mas seu destino não se perpetua,
Ele nasceu para cantar na rua
E não para ser arquivo de Cartório!
Mande soltá-lo pelo amor da noite,
Que se sente vazia em suas horas,
Para que volte a sentir o temo açoite
De suas cordas leves e sonoras!
Libere o violão, Doutor Juiz,
Em nome da Justiça e do Direito,
É crime, porventura, o infeliz,
Cantar as mágoas que lhe enchem o peito?
Será crime, afinal, será pecado,
Será delito de tão vis horrores
Perambular na rua o desgraçado
Derramando na praça suas dores?
É o apelo que aqui lhe dirigimos,
Na certeza do seu acolhimento,
Juntada desta aos autos nós pedimos,
E pedimos, também, DEFERIMENTO...
O Juiz, para não ficar por baixo, deu no verso o
seguinte despacho:
Para que eu não carregue
Remorso no coração
Determino que entregue
A seu dono o VIOLÃO!
·
"Recebo a petição escrita em verso,
E despachando-a sem autuação,
Verbero o ato vil, rude e perverso,
Que prende, no cartório, um violão.
Emudecer a prima e o bordão
Nos confins de um arquivo, em sobra imerso,,
É desumana e vil destruição,
De tudo que há de belo no universo.
Que seja solto, ainda que a desoras,
E volte à rua, em vida transviada,
Num esbanjar de lágrimas sonoras.
Se grato for, acaso, qo que lhe fiz,
Noite de lua; plena madrugada,
Venha tocar `porta do juiz.!
E despachando-a sem autuação,
Verbero o ato vil, rude e perverso,
Que prende, no cartório, um violão.
Emudecer a prima e o bordão
Nos confins de um arquivo, em sobra imerso,,
É desumana e vil destruição,
De tudo que há de belo no universo.
Que seja solto, ainda que a desoras,
E volte à rua, em vida transviada,
Num esbanjar de lágrimas sonoras.
Se grato for, acaso, qo que lhe fiz,
Noite de lua; plena madrugada,
Venha tocar `porta do juiz.!
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