T R A J E S D O M É
S T I C O S
Pediram-nos que
escrevêssemos como foram os trajes domésticos de nossas infâncias. Também nos
foi pedido á falar daqueles trajes em crianças que nos obrigavam há usá-los,
porém, eu os detestava.
É impossível falar de
costumes de um povo sem levar em consideração sua condição financeira. Apesar
dos dizeres: não é a barba que faz o filósofo, não é o hábito que faz o monge;
e tantos outros. Na prática a coisa não é bem assim, pelo contrário, as
aparências enganam, “a primeira impressão é a que fica”, sou mais essa citação.
Com raríssimas
exceções, pela a maneira de vestir de alguém, entende-se sua situação
financeira e a que classe social ela pertence. Eu nunca neguei para ninguém
como foi pobre minha infância, também, nunca fiz segredo da pobreza daquela
gente que faziam parte de meu mundo.
No meu livro: “O Anjo
da Noite e Outros Contos” tem uma crônica, - Tocador de Pífano – em que entre
outras coisas eu descrevo a roupa do João Moreira, ela era só remendo e o resto
todo rasgão. Aquele traje dele não era exceção naquelas paragens, os remendos e
os rasgões na roupa do trabalhador rural eram comuns, e foi naquele mundo que
eu vivi.
Eu aos dezesseis anos
de idade e, pertencendo a uma parcela da sociedade local. E que minha condição
financeira não acompanhava. A prova disso ficou provada num fato que não dá
para esquecer. Ia haver uma grande festa e para a qual eu deveria comprar um
terno novo, afinal todos os meus colegas comprariam; também minha namorada era
filha de um rico do lugar, não dava para disfarçar. Não pude custear. Não deu!
E sem poder comprar a tal indumentária, somente uma opção me restava: migrar. Ir
embora. E foi isso que me fez deixar minha terra natal ainda quase
criança. – Sem mágoa! – Meu querido
Ceará não perdeu um filho, continuo amando como filho que sou. Porém, o Rio de Janeiro ganhou um carioca.
Por todos esses fatos narrados aqui, aquelas crianças de lá nas quais eu estava
incluído, não possuíam mais de duas roupas. Dessas, a melhor era escolhida para
ir á missa, sair aos domingos e para ir ás diversões. A outra era chamada de
-bate e veste- isso porque, essa pobre coitada agüentava o maior tranco de
segunda a sexta-feira na roça, e sábado ia para a pedra, ser batida para largar
o grude. Esses eram nossos trajes domésticos.
Quanto ás roupa que
nos era oferecido em criança e que vestíamos, porém não gostávamos. Fica muito difícil.
Depois que descrevi as dificuldades que aquela gente tinha para comprar uma
roupa, seria no mínimo um contra-senso dizer que alguma roupa nos era oferecida
e que nós não gostava. Podia ser até mesmo feita com o riscado ceará, um tecido
de algodão cru feito em Sobral e que tinha umas listas na vertical, verde ou
azul.
Do livro: “Fragmentos de Uma Oficina Acadêmica”
De Amadeu Lucinda.
Clique para responder para todos
|
|
Nenhum comentário:
Postar um comentário